Ainda na prefeitura, fiquei observando uma mulher (de descendência) japonesa. Naqueles bancos de três lugares, eu sentei na ponta e ela, na fila da frente, no meio. Assim eu tinha visão perfeita dela lendo jornal, a Folha de Londrina. Fiquei de olho na forma de leitura dela, até mesmo para responder a uma dúvida que sempre tive durante o período que trabalhei em jornal: será que as pessoas lêem o jornal por completo? O que mais interessa ao leitor?
O provável perfil da mulher: japonesa, bem instruída (isso é até um pouco de redundância. Difícil alguém de origem japonesa que não tem pelo menos o Ensino Médio. A mulher deveria ser formada em Contábeis ou Administração), casada, aparentemente despachada. Ela pega o primeiro caderno, olha a capa atentantamente e começa a folhear. Lê as cartas do leitor, o Informe Folha e pula para as páginas seguintes. Em Geral, Brasil e Mundo, ela só dá uma olhada nas manchetes.
Pega o caderno de esportes e nem desdobra. Já passa para o Cidades. De longe, me chamou a atenção a matéria da capa. A 47 horas do Eldorado, uma reportagem de Wilhan Santin sobre a viagem mais longa que se pode fazer partindo de Londrina sem trocar de veículo. Uma bela reportagem, que só pude ler depois. Mas a leitora em análise olhou a foto, a manchete e passou reto. Na hora pensei: "Puxa vida, o cara passa 47 horas na estrada pra fazer uma reportagem, sem contar a volta, e a pessoa nem se dá ao trabalho de ler nem o primeiro parágrafo?". Quantas e quantas matérias exigiram grandes esforços dos jornalistas e pessoas que estavam com o jornal na mão simplesmente ignoraram?
Ela olhou rapidamente as páginas internas e parou na coluna do Militão. Depois, na Folha2, demorou-se mais. Virou de lado e passou direto à coluna social, da Vanusa Macarini. Leu todas as notas, olhou atentamente as fotos, decerto reparando nas roupas ou cabelo das colunáveis. Após isto, foi vendo o caderno de trás pra frente, parando novamente no horóscopo, filmes e programação de cinema. Leu toda matéria sobre os reality shows do SBT.
No caderno de Economia, olhou o topo e o pé de cada página, só pra se certificar que não estava perdendo nada. Chegou nos classificados. Olhou vários anúncios de imobiliária. Constatei que ela era do ramo. Depois olhou nos anúncios de venda de carros e terminou.
Como estava demorando, ela pegou de novo o jornal e começou a ver matérias que na primeira passada tinham sido puladas. Aí a chamaram. Podia ao menos ter deixado o jornal ali na praça de atendimento, pra que todos pudessem ler a matéria do Wilhan.